sexta-feira, 11 de outubro de 2013

Separado, com duas filhas e quer ser sacerdote franciscano

Abelardo procura um frade franciscano, promotor vocacional, onde busca orientação para o seu caso. Inicia a conversa, dizendo que quando tinha vinte anos de idade, namorou por dois anos, noivou e se casou com Filomena. O casamento foi realizado apenas no civil, porque não tinha condições, segundo ele, de contrair matrimônio na Igreja, porque era muito caro organizar toda a festa. Depois de um ano de casado veio a primeira filha. Três anos mais tarde, veio a segunda filha. As duas filhas são muito queridas de Abelardo. Porém, o seu casamento começou a ruir, a partir do momento em que Filomena cometeu adultérios, com outros homens. Interrogado então pelo frade, do porquê dele estar ali, Abelardo responde que se casou, mas vive infeliz desde o início. No fundo, se não fosse a influência de sua mãe e dos amigos, que achavam que seria besteira, ele teria entrado para o seminário desde jovem. Então, por que casou? Casou-se porque não havia saída, ou seja, já tinha engravidado Filomena e logo veio a segunda filha, que cada vez o amarravam mais em sua decisão errada. No entanto, Abelardo sempre pensou em ser sacerdote franciscano. E depois de muitos momentos de noites escuras, resolveu por bem se divorciar de Filomena, sobretudo devido às contínuas infidelidades cometidas por ela. Perguntado ainda se não gostaria de uma segunda chance, com outra mulher, afirma que isso não o realizaria, que do fundo do seu coração, o seu radical desejo seria completado, se pudesse ser um religioso sacerdote. Hoje, com quarenta e três anos de idade, pergunta se seria possível entrar para um seminário e como seria encaminhado o seu  caso?

Penso que devemos partir do pressuposto que nunca é tarde para encontrar o caminho da felicidade, mas tendo os pés no chão em base aos compromissos assumidos e o futuro vínculo com vida consagrada, se é que isto seja possível em base ao que segue:

1. Do ponto de vista do direito próprio dos institutos de vida consagrada (congregações ou ordens religiosas), de acordo com o cânon 643, § 1, 2°, é vetado o ingresso na vida religiosa consagrada, através do noviciado, ao cônjuge que ainda esteja ligado ao vínculo matrimonial. Tal vínculo surge de matrimônios ratificados e consumados, ou de matrimônios simplesmente ratificados. Por outro lado, não se constitui em impedimento, o caso de pessoas viúvas e daqueles que já receberam a dispensa do Romano Pontífice, por matrimônio não consumado ou ainda por um matrimônio declarado nulo pela Igreja.

2. Em sentido mais amplo, a Igreja não admite o divórcio civil de casamentos realizados na Igreja (matrimônios), por se constituírem em sacramento. Mas não é o caso, porque Abelardo e Filomena se casaram apenas no civil. E mesmo que tivessem contraído matrimônio na Igreja (can. 1042, 1°), na questão em epígrafe, não estaria em jogo o novo enlace matrimonial, mas uma possível passagem do estado matrimonial para o estado de religioso consagrado. Para tanto, já que houve o divórcio, o vínculo jurídico respaldado pelo Estado já foi dissolvido e Abelardo não estaria proibido a dar outro passo em sua decisão. Ocorre lembrar que a razão teológico-jurídica do veto a quem não esteja livre impede a pessoa ao voto de castidade a ser professado na vida consagrada e além do mais, à promessa do celibato, como vínculos incongruentes com alguém que esteja ligado a exigências matrimoniais.

3. No que tange ao direito próprio de cada Instituto de Vida Consagrada, a Regra da Ordem dos Frades Menores, por exemplo, estabelece que se a pessoa é casada, que haja a licença da referida esposa, manifestada por ela, com autorização do Bispo diocesano (Regra Bulada, 2).

4. No caso do cuidado das filhas, enquanto menores de idade, que a questão seja encaminhada de acordo com as normas do Estado. 

5. Alguns Institutos de Vida Consagrada não aceitam candidatos com idade acima de 40 anos, porque os candidatos podem apresentar problemas de ordem psicológica, familiar ou até na intenção em querer se acomodar dentro da vida religiosa, Isso ocorre, por exemplo, quando não foram bem sucedidos na vida a dois ou em outras escolhas profissionais e vocacionais mal resolvidas. Mas isso não é uma questão canônica e sim de encaminhamento dado, que podem ser sanados no acompanhamento vocacional. Em outras palavras, é um direito do candidato, que nem sempre é passível de se concretizar, por encontrar empecilho no instituto, que o aceita ou não, respaldado em sua experiência e normas próprias.

6. Portanto, se a pessoa interessada manifestar clareza em sua decisão vocacional, depois de resolvidos os problemas civis com suas filhas e ter passado por um programa de formação humana, filosófica e teológica, poderá ser acolhido no instituto, podendo inclusive ser ordenado presbítero na Igreja. E se houver sinal verde, que apresente a documentação exigida, sobretudo uma carta de sua ex esposa, em que Filomena expresse que Abelardo estaria livre para seguir o seu caminho.

Um comentário:

Anônimo disse...

Frei Ivo, achei por acaso seu blog. Muito claro e objetivo. Parabéns.
Paulo